sábado, 31 de março de 2018

Violência: aspectos psicológicos e sociais




Para começarmos a falar sobre violência vamos as definições encontradas no dicionário HOUAISS: 

1 qualidade do que é violento. 2 ação ou efeito de empregar força física ou intimidação moral contra; ato violento. 3 exercício injusto ou discricionário, ger. ilegal, de força ou de poder. 4 força súbita que se faz sentir com intensidade; fúria, veemência. 5 termo jurídico: constrangimento físico ou moral exercido sobre alguém, para obrigá-lo a submeter-se à vontade de outrem; coação. 6 Derivação: por extensão de sentido: cerceamento da justiça e do direito; coação, opressão, tirania. 

Então tomamos como violento comportamentos onde alguém investe força, intensa sobre alguém para demonstrar poder, fúria, subjugar ou coagir. 

Na psicologia vamos adotar a visão de homem e de mundo em que as pessoas não nascem prontas, são construções sócio históricas. (teoria Sócio histórica/ teoria histórico cultural). Entendemos a personalidade como uma construção social e histórica, realizada na escola e pelas famílias, diante dos aspectos sociais e culturais valorizados na coletividade. 

Aspectos Psicológicos:

Do ponto de vista de patologias, devemos considerar que algumas psicopatologias estão frequentemente associadas ao comportamento violento, crimes e assassinatos. No caso dos sádicos, que são pessoas que sentem prazer em provocar dor no outro, não pode ser usado como argumento para o aumento da violência na vida contemporânea, pois representam 1% da população mundial. O mesmo podemos dizer de psicopatas, que são caracterizados como egoístas, insensíveis, frios, mas que nem sempre são pessoas violentas ou assassinos. O que desencadeia o descontrole e a violência em pessoas com psicopatias são situações de agressão e abuso vivenciadas por estas pessoas. Significa que temos entre nós psicopatas extremamente competentes em seus trabalhos, pessoas que não são violentas e na população mundial é de 1% á 4% de pessoas com psicopatias. Alguns diriam que as drogas fazem as pessoas ficarem violentas, é possível, porem o uso de drogas está relacionado a uma grande gama de fatores, sociais, pessoais e culturais. Algumas pessoas podem buscar nas drogas o alivio para algum sofrimento, e viciadas, perdem o controle de suas ações agindo de forma agressiva e impulsiva. 

Lançamos a pergunta, a mesma feita por Zimbardo nos anos 1970, sobre o que faz as pessoas comuns, tidas como boas, desenvolverem comportamentos violentos. Algumas pistas já nos são dadas quando olhamos para as situações diárias: terrorismo, guerra, bullying, estupro, assassinatos e sequestros. Motivos como fundamentalismo religioso e questões de poder. Podemos observar a guerra na Síria, os atentados terroristas, o genocídio em Ruanda (1994) e os tiros nas escolas americanas (onde há maior ocorrência deste crime relacionado ao bullying) já dão as pistas do quanto as situações sociais são disparadoras de atos violentos. 

Aspectos Sociais: estudos desde 1970. 

Aspecto social do comportamento violento foi estudado por Philip Zimbardo nos anos 1970, que por sua história de infância no nos bairros pobres em nos EUA se fazia perguntar porque algumas pessoas que eram boas acabavam tendo comportamento violentos. 

Estudo de Zimbardo, em 1971, conhecido como o Experimento da Prisão de Stanford contou com auxílio de um ex-presidiário para reproduzir na universidade o ambiente de uma prisão. Foram recrutados estudantes voluntários, foram avaliados para que se tivesse um perfil psicológico de pessoas estáveis e sem histórico de violência. Alguns foram escolhidos de forma aleatória para serem os guardas e outros os detentos. 

Para potencializar o efeito da prisão, a policia buscou os estudantes em suas casas para realizar a detenção e uma rede de TV acompanhou e noticiou prisão dos voluntários. Ao despersonalizar as pessoas, tanto prisioneiros, quanto guardas, as instruções dadas é de que não seria aceito violência física, mas que poderiam usar o recurso psicológico que quisessem. O estudo deveria durar 15 dias, mas no segundo dia o ambiente já estava muito violento e no 4º dia alguns estudantes apresentavam esgotamento emocional pelas situações vividas de humilhação. 

No sexto dia o experimento foi suspenso, após a vista de uma estudante, que considerou desumano e antiético a continuidade do mesmo, pois já era possível observar comportamentos agressivos e violentos por parte dos guardas- estudantes. 

O próprio pesquisador se envolveu no estudo como supervisor da prisão e por durante 30 anos não conseguiu escrever sobre o experimento, tamanha intensidade do experimento, e por ter se deixado levar pelo papel de supervisor e não conseguir perceber o quão cruel estava sendo. 

30 anos depois, Zimbardo pode nos dizer sobre como esses atos violentos crescem: 

1. Começar sem pensar: abusar uma vez, leva a abusos maiores 

2. Desumanização: do outro ao tirar dele qualquer traço de individualidade, e de si mesmo com uniformes ou codinomes, ou quando estamos em uma multidão. 

3. Divisão da responsabilidade: exemplo em uma briga de torcidas, todos brigaram, sua ação não conta. 

4. Obediência cega a autoridade: quando o violento apenas executa. 

5. Adesão passiva as normas do grupo: exemplo do ódio das torcidas rivais. 

6. Tolerância passiva a maldade: Você não impede e deixa acontecer. 

Vários outros exemplos são dados em sua obra: o genocídio em Ruanda, em 1994 e as torturas realizadas pelo exército americano com presos de guerra. 

Se observarmos podemos ver em nossa realidade várias situações em que a violência obedece essas regras como a intervenção da polícia em situações de manifestações populares, escolas e hospitais, para não dizermos das próprias prisões e comunidades. Para não citarmos outras situações sociais como a desigualdade econômica e dificuldade de acesso a educação, saúde e assistências sociais básicas para o bom desenvolvimento das pessoas. Soma esse fatores a banalização da violência, já descrita por Hanna Arendt, nos mostra o quanto suas ideias ainda são atuais e somam ao experimento de Zimbardo. Mais do que oferecer um mapeamento sobre o comportamento violento, Zimbardo oferece uma possibilidade de superação e luta contra a banalização. 

Ao observarmos a figura de M. C. Escher (2006), podemos tanto enxergar anjos como demônios, assim também é a personalidade humana. Não somos completamente bons ou maus, temos os dois em nossas possibilidades de ação em que as condições é que irão determinar que ação iremos realizar. 


Zimbardo ainda diz que os heróis não são pessoas extraordinárias ou poderosas. Contando com exemplos de pessoas comuns que tiveram coragem de intervir em situações de agressão, ou interromper um ciclo de violência, essas pessoas comuns se tornaram heróis pois foram capazes salvar vidas. Citamos a estudante que discutiu com o próprio Zimbardo, alertando o de que o experimento já tinha colhido informações e deveria ser interrompido. 

Um programa com 10 passos para o desenvolvimento do altruísmo melhora a resposta das pessoas e não as deixa ceder tão facilmente ao lado mau. 

1. Admitir os erros. 

2. Estar atento as outras pessoas e a si mesmo, desenvolvendo o pensamento crítico desde criança. 

3. Se responsabilizar ao menor dos atos dentro de uma cadeia de acontecimentos. 

4. Buscar sempre o seu melhor e evitar julgamentos e rótulos para as pessoas. 

5. Respeitar a autoridade justa, mas conseguir se rebelar ao que é injusto. 

6. Valorizar sua independência mais do que as regras de um grupo. 

7. Ser vigilante ao panorama geral. 

8. Equilibrar a noção de tempo, agindo no que é necessário no presente sem depender de um ou dois quadros temporais (passado ou futuro). 

9. Não abdicar de sua liberdade cívica e pessoal pela ilusão de segurança. (muito comum nas situações de bullying, quando outros colegas agridem o mais fraco para se sentirem protegidos) 

10. Se opor a sistemas injustos buscando de forma pacifica e na união com outras pessoas um grupo coeso para desenvolvimento de boas ações 

Esses 10 passos são o princípio do desenvolvimento da imaginação heroica, para que as pessoas possam cada vez mais conseguir intervir nas situações de violência. Uma mesma situação pode aflorar: mais violência, indiferença ou atos heroicos. Incentivar as pessoas a não agirem passivamente em situações de violência desde pequenos é investir na educação de crianças para a bondade. 

Zimbardo ainda enumera vários tipos de heróis, mas que não cabe aqui em nosso espaço. Fica a indicação de leitura e filme. No Youtube há filmagem original do experimento.

Referencia Bibliográfica:
ZIMBARDO, Phillip. Efeito Lúcifer. Rio de Janeiro: Record, 2016.
Filme: A experiencia da prisão de Stanford. (Netflix)